A V I S O


I am a Freemason and a member of both the regular, recognized ARLS Presidente Roosevelt 75 (São João da Boa Vista, SP) and the GLESP Grande Loja do Estado de São Paulo, Brazil. However, unless otherwise attributed, the opinions expressed in this blog are my own, or of others expressing theirs by posting comments. I do not in any way represent the official positions of my lodge or Grand Lodge, any associated organization of which I may or may not be a member, or the fraternity of Freemasonry as a whole.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Penúltima da série: a Concentração Correta

Hoje discuto um passo do Nobre Caminho Óctuplo que me é especial. Em toda minha vida não houve aspecto mais trabalhoso em que eu tenha me debruçado. Sabem,  creio que tenho TDAH, ainda hoje. Relembrando os depoimentos familiares e averiguando certos fatos, vejo que eu sempre lidei com este distúrbio. Por exemplo - não só isso, sei, mas veja - para guardar algo em minha memória preciso ter total silêncio e concentração atenta, perseverante, senão  puft!  algo que vi ou ouvi  'some' como vapor na atmosfera... Os anos que pratiquei Yôga e zazen (tenho minha almofada apropriada de meditação zen - o  zafu - até hoje!!)  foram muito bons para dar conta de grandes incumbências, em especial o Mestrado e o Doutorado.  Não sei se as conseguiria sem estas disciplinas pessoais,  estas práticas.  Hoje, estou bem estabilizado, inclusive por causa de sessões periódicas de acupuntura com um profissional muito sério e competente, meu amigo Prof.  Adão Carlos.

Em essência, a prática da Concentração Correta consiste em cultivar uma mente 'focada', habilitada em dar conta efetivamente de uma coisa por vez, (con)centrar-se em um aspecto do campo fenomênico a cada vez. Nossa 'mente de macaco' - que pula sem parar ali e lá e para acolá - é o maior empecilho para que atinjamos eficiência e eficácia nester mister de considerar o ser, o situar-se no aqui-e-agora. Sabem como primacialmente se treina a concentração? Isso, é meditando... No Zen, praticamos zazen, a meditação sentada (olhando por uma hora ou mais uma parede branca à nossa frente) e, também, uma espécie de 'meditação andando', onde caminhamos beeem devagar (o nome é kinhin), pé ante pé, nos intervalos de um zazen e outro, em postura apropriada. E, obviamente, tudo em completo silêncio! Aliás, até as refeiçoes na comunidade zen é realizada sem nenhum pio...

Quando estamos meditando a mente nunca para, mas o segredo é 'deixar vir, deixar ir'... assim, com o tempo conseguimos deter a voragem do pensar. A mente é uma coisa maluca mesmo; nem quando dormimos o cerebro se interrompe - o que é o sonho, não é mesmo?

Há vários degraus de concentração e mormente galgamos passo a passo esta competência. Um outro segredo é começar a escutar nossa respiração. Quando respiramos, respeitando nossa natureza, ficamos mais capazes de focar nossa atenção, de domar a mente de macaco.

Há várias maneiras de se treinar concentração, tantas quantos os mestres que existem, ao que tudo indica... O problema então pode ser encontrar um bom mestre, se você for iniciante. Mas sei de pessoas que encontraram a paz de modo autônomo, autodidaticamente. Uma vez vi um modo de meditar que é sentar e ficar olhando para uma vela bruxuleante, num ambiente calmo e em silêncio. Fiz algumas vezes e acho que pode funcionar. O método que acho cem por cento é o do Budismo Sotozen - zazen e meditação andando. Mas acho que qualquer prática honesta e perseverante pode dar resultado. O importante é caminhar, trilhar uma senda, percorrer uma vereda só nossa... Vai chegar uma hora que qualquer atividade, qualquer prática é uma meditação... Eu, por exemplo, gosto muito de lavar pratos (na companhia de minha esposa, então, é um prazer diário), fazer barba dos meus velhos no asilo...; tudo feito com concentração apropriada pode ser uma meditação, um praticar onde todo o seu ser está 'focado', centrado...

Praticantes de meditação sentada Zen (zazen)
(fiz muito isso no Templo da Comunidade Soto Zenshu
em São Paulo, que fica na Rua São Joaquim, 
no bairro da Liberdade - ver abaixo 2 ultimas fotos)
Foto obtida agora, via Google Images, de
http://anshin.it/en/pratica-zen/zazen
(este parece um site sério - boas pesquisas!!)

Praticantes no kinhin
Foto obtida agora, via Google Images, de
http://www.flickr.com/photos/23236468@N04/3852450685/
(tem outras fotos legais lá, enjoy!!)

Templo Busshinji de São Paulo
http://www.sotozen.org.br/index.php
(fotos acima e abaixo)

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Raízes...

Ilustração obtida agora via Google Images de
http://www.biblesamacharam.com/popular-christian-wallpapers-for-download

Todos sabem de minhas raízes cristãs - já comentei aqui anteriormente. Dos 5 filhos do casal Geraldo e Firmina sou o único que professa a Fé Reformada, um dos maiores ramos do movimento protestante. Relembro, já comentei aqui, com carinho, as reuniões familiares que minha mãe dava na sala de jantar com a filharada, falando da Bíblia. Naquela época eram-me coisas um tanto incomprensíveis, mas ficou a semente, inequivocamente. Sempre senti um apelo intenso 'pedindo' minha volta ao redil - coisa que nunca duvidei que seria agraciado (não sei porque, pois os desígnios de Deus são incompreensíveis a nós, finitos e decaídos que somos) - mas que agora com todo o ensinamento que recebi (e continuo buscando) eu consigo entender melhor. 

Foi muito doloroso o período afastado de Deus, agora consigo dimensionar. Quanto tempo perdido. Mas quanta misericórdia e graça sobre graça! Minha gratidão ao Pai Celestial não tem tamanho. Sei agora que Ele nunca desistiu de mim. O peso de minhas faltas era enorme para carregar, e ainda me enche de tristeza (pois muito do mal que fiz não tem volta ou reparação), não importa que eu saiba que Jesus vai estar pronto para me abraçar quando eu atravessar o rio.  Mas o horror do peso dos meus pecados, do afastamento que implica entre meu Criador e eu, é algo que chega a desesperar. Mas a certeza do sacrifício expiatório de Jesus pelos seus eleitos nos conforta e enche de esperança. Não há lugar mais para o desepero, e sim contentamento e gratidão. 

O que o Pai Celestial espera que nós façamos é que O temamos, O obedeçamos. E uma das incumbências mais especiais que podemos receber é o casamento. O desafio de cumprir o que Deus determina em seu Pacto no tocante ao matrimônio é, antes de tudo, uma bênção e um privilégio. Bênção de recebermos uma esposa nesta jornada, para nos ser como co-adjutora, conselheira e companheira nas tarefas que devemos cumprir. E um privilégio no sentido de termos uma rara oportunidade de aprendizado e de serviço.

Gosto muito de ver minha esposa ser a pessoa que é. Nosso dia-a-dia é permeado 98% de risos, alegrias, brincadeiras e companheirismo puro. Somos parceiros em tudo, sem perder a identidade de nossas existências específicas, nossos afazeres pactuados. Gosto de ver como Bilú cuida tão zelosamente da casa, dos seus adereços e guarnição; como ela, vaidosa que é, cuida de seu corpo e mente de modo a ser sempre uma bonita criação de Deus. Até as manias, as idiossincrasias de mulher costumo achar bastante graça. Gosto de ver as caras que ela faz quando a provoco. É muito engraçado, ela, que não faz mal a uma môsca, com seu metro e meio de altura, ficando brava comigo... Sou sempre atento ao ensinamento que Deus me provê por meio dela, pois isto também me foi designado por Ele através dela. Procuro cumprir o que o Pai Celestial espera de mim diante dela. É muito divertido - nunca entramos em tédio, apesar de nossa vida ser bem regulada, rotineira, previsível... nossa casinha velha, humilde mas muito arrumada é a nossa grande bênção, graça recebida sem o merecermos. É o nosso castelo, e apraz-me muito viver aqui, com nossos vizinhos; aqui, tão perto do centro da cidade, com tudo à mão, com tantas facilidades... Imaginava uma casa assim, mas recebê-la de Deus foi algo que guardo em meu íntimo como uma revelação e confirmação - só eu o sei.

Sei que tive dois casamentos anteriores que não deram certo, e não fico procurando culpado(s) porque os relacionamentos não continuaram. Casei na Igreja e no cartório das duas vezes anteriores também; nunca desejei terminar nenhum casamento. Fico mortificado pelo fato de meus filhos terem crescido longe de mim - não pude acompanha-los convenientemente, já o disse várias vezes. Não penso nisto como 'castigo' ou algo parecido; deixo muitas coisas para saber quando me encontrar com Ele (vai, inclusive, que estas preocupações não sejam mais importantes lá...) naquela outra dimensão, noutra Vida. Procuro meditar onde errei, onde não agi como devia, onde não amei minhas ex-esposas como deveria. Nem o fato de ter pedido perdão as fizeram me perdoar. Mas o importante é que sei que Ele me perdou. Este peso de ser divorciado é fardo pesado de carregar, e vou morrer com ele, lembrando-o todo dia de minha vida.

Sou muito grato ao Pai Celestial pela oportunidade de voltar ao redil - não compreendo aqui nesta esfera como Ele se apiedou e tem misericórdia de um ser tão abjeto como eu. Com todas estas experiências que vivi, todas serviram - agora vejo - para confirmar em meu íntimo (muito, muito mais espiritualmente do que racionalmente, ainda que nossa Fé seja racional) as verdades da Fé Reformada, de como a Palavra deve ser estudada unicamente a partir do que encerra a Bíblia. Tudo o que passei nesta vida, vejo agora, vai se 'encaixando', se significando em meu íntimo como uma sucessão de misericórdias imerecidas, tantas as coisas 'boas' (inúmeras) quanto os percalços e  provações. Deus Soberano dirige minha vida, ainda que eu seja tão imperfeito e decaído.  Nada aqui vale mais do que isso. 

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Fábula do Asno, Raposa e Leão


Gravura obtida agora (via Google Images) de 
http://muralespacolivre.blogspot.com.br/

Conta a fábula (The Ass, the Fox and the Lion, fábula nro. CXXI, p. 127) que, depois de decidirem ser parceiros, um asno e uma raposa foram ao campo caçar. No caminho, eles encontraram um leão e, visualizando o perigo à frente, a raposa correu direto ao leão e sussurou "se você prometer não me ferir, eu trairei o burro e você facilmente poderá subjugá-lo". 

O leão concordou, e a raposa manobrou de modo a colocar o asno numa armadilha. Logo depois do leão capturar o asno, ele rapidamente atacou a raposa, reservando o asno para a sua proxima refeição. Moral da estória, conforme assinalado por Jack Zipes (Aesop's Fables, London: Penguin, 1996,  Col. Penguin Popular Classics n. 20): Traidores devem esperar deslealdade...

Atualmente vemos ali e acolá, não importa onde vivamos ou trabalhamos, uma procissão interminável de pessoas muito preparadas, algumas detentoras de elevada escolaridade, ensejando que demonstrem uma capacidade de resolução de problemas realmente marcante.   Chega a incomodar a pretensa 'segurança' (por vezes empáfia) que alguns, de modo blasé, demonstram em sua desenvoltura. Por vezes tal (auto)confiança como que autoriza a pessoa a tratar com deslealdade seu semelhante, sempre colocando-o em segundo plano, como um meio para alcançar fins nebulosos. O que mais impressiona é o pretenso desconhecimento do fato inexorável de que eles também assim serão tratados, por aqueles a quem desprezaram ou por outros de quem não esperavam tal conduta... É a natureza do homem imperfeita, decaída. Não somos leais mas detestamos quando não são leais conosco.

Tenho dificuldades de me relacionar apropriadamente com as pessoas, ainda não sei bem o porquê. Creio que esta Psicologia toda que estudei no fim acabou me atrapalhando, não sei ao certo - identifico sempre intelecções ou intencionalidades que -vá lá saber - podem não ser as mais fidedignas, mas assim as assumo... No entanto, procuro ser muito ético nas minhas relações, pois a Lei manda "agir com os outros como gostaria que agissem com você". É o grande desafio para qualquer vivente, pois somos muito falhos. Mas como o Pai Celeste vasculha nosso íntimo e nos julgará conforme nossas intenções, espero ser apreciado pelo que avalio como justo, em especial no que Ele mais espera de mim, em meu casamento.

Agora, chegando perto da casa dos 60 anos, posso dizer que sou muito realizado, e isso 99% por causa da espiritualidade, da reconciliação, da regeneração que graciosamente recebi. Penso hoje que as coisas multifacetadas deste mundo tem de estar na correta perspectiva para o crente, pois muitos são os valores e preciosidades da vida terreal, mas a maior parte em desacordo com que prescreve a Palavra de Deus. Consegui muito nesta vida (não tanto por mim mesmo, mas pela graça imerecida do Pai Celestial), mas digo que nada vale mais do que estar bem com Deus.  O Pai Celestial é leal, e nunca se diria que nos trairia - Ele cumpre o que promete. Somente um louco, por outro lado, trairia a Deus, depois de tudo o que pactuamos com Ele. 

Por muito tempo em minha vida tive insônias. Demorava a conciliar o sono. O peso de meus maus atos me atormentava por demais. Fiz muita gente infeliz. Minha consciência me acusava e demandava mudança. Minhas orações foram atendidas, pois não tive medo de me humilhar perante Ele; na verdade, chega uma hora que não temos mais como justificar nosso lamaçal. Recebi a chance de me reconciliar e prometi doravante ser leal ao Pai Celestial. Digo hoje que nada mais vale neste mundo do que recostar a cabeça no travesseiro à noite e dormir o sono dos justos (Salmo 127: 2b ; Provérbios 3: 21 a 24); pegar logo no sono, depois das orações e do beijo na esposa... 

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Pluralismo, plural


foto obtida agora via Google Images de
http://enikselom.blogspot.com.br/2010_05_01_archive.html


Quinta feira ‘braba’, como se diz na minha terra, depois de mais um dos afamados festejos momescos. Eu brinquei em minha vida somente um ou dois carnavais – depois de constatar que o cheiro de cigarro ficava muito impregnado na minha roupa - vi que o ambiente (problematizado pelo estado alcoólico de muitos frequentadores) não era promissor para minha segurança e desenvolvimento. Nem pela TV acho muita graça... Procuro saber mais noticias nos veículos impressos de grande circulação. Mas mesmo com as magras edições, não deixo de ler os principais  jornais, em papel (sim, gosto ainda desta prática antiga) e no formato digital, via PC ou tablet.

Uma tendência moderna que se vê nestes importantes veículos de comunicação de massa é a coleção de colunistas, que todos os jornais reúnem, convidando-os (ou pagando boas somas) para interpretar os acontecimentos. Como tudo na sociedade, abarcam estas heterogêneas coletâneas ensaístas e articulistas bons e ruins, além dos medíocres. É impressionante a gama de assuntos que eles e elas discutem, alguns que nos fazem ficar matutando onde foram busca-los – alguns, imagino, vislumbraram-nos, aparentemente, sob efeito de alguma substancia inebriante, dada a desimportância ou maluquice.

Gosto do jornal Folha de São Paulo, talvez o maior e melhor hoje em brasólia. Ele se gaba de ter uma gama pluralista de colunistas, escalando-os em dias específicos para desfiarem suas intelecções, pareceres e até diatribes. Lê-se coisas interessantes, bobagens, discursos divertidos e outros bem instrutivos. Este jornal é tão eminente que seus colunistas e articulistas costumam comentar e discutir (civilizadamente ou não) entre si os próprios escritos que publicam, verberando ou dando perfil laudatório ao discurso. E haja pluralismo...

Cresci na Academia acreditando que o debate, a peleja, a controvérsia são necessários, principalmente sob a égide da cortesia, da polidez, para bem descrever, esclarecer, instruir, interpretar e compreender a realidade multifacetada, multidimensional, embasbacante. Ou seja, da ‘discussão nasce a luz’, para citar um brocardo conhecido. Mas o que parece imperar hoje, nos jornais, revistas, na academia (sempre com honrosas exceções, e que não são poucas) é discutir para ter luz, mas luz dos holofotes, quem ‘aparece’ mais, quem choca mais (como alguns colunistas da Folha), quem é mais comentado/a pelos demais, para o bem e para o mal (ou pelo bom ou pelo mau...). Veja só:  Contardo Calligaris, na sua coluna da Folha de São Paulo de hoje, quinta feira, 14 de fevereiro de 2013 (Ano 92, nro. 30.633, ‘Saudade de ideias perigosas’, Caderno Ilustrada, p. E-8), lembrando de Foucault, pergunta se, neste cenário de grande permissividade, onde se permite dizer tudo de qualquer coisa, por que discutir, por que lutar por qualquer ideia? Mesmo porque, digo eu, parece - já o disse outro dia -  que não é mais feio proferir sandices, disparates ou redundâncias... Contardo pergunta ao final de sua coluna se não seria o caso – será... - de ‘falar e deixar falar’?...

E como ficam - volto a colocar esta constatação - dentro desta confusão, os jovens, minha maior preocupação como educador? A exigência que se faz, na Faculdade, para que eles leiam, leiam, leiam é enorme, em todos os sentidos. Mas como ‘filtrar’ o que se lê, como categorizar, como arquivar convenientemente a enxurrada de dados e informações? Eu gostaria de ter uma resposta clara, cristalina, mesmo um tipo de ‘receita’, mas cada um deve achar, dando ‘cabeçadas’ ou não, o seu caminho. Somente existem linhas gerais de conduta: averiguar credenciais da pessoa, criticar o texto de modo minudente, estabelecer ‘pontes’ entre discursos conexos (da pessoa e de seus pares; aliás, mesmo que também seja oriundo de outros campos) etc. A lista de estratégias é grande. Um profissional que não domine minimamente certas regras do uso da linguagem, da razão, tem escassos horizontes de sucesso. Mas o exaustivo desafio é recompensador: saber discernir, em cada campo do saber e em cada profissão (e isso cada vez melhor), o joio do trigo; diferenciar a ilusão da certeza, experimentar a satisfação da clareza da decepção do engano e, principalmente, averiguar os frágeis limites daquilo que é quimérico em relação ao que é real.  Acho que contribuir para que isso ocorra faz parte de minha missão, nas diversas matérias que ministro na Universidade. Que Deus me ajude nesta tarefa cada vez mais complexa!

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

O Esforço Correto


Gosto, artísticamente, das figuras do Lorde Gautama (o conhecido príncipe indiano Siddharta Gautama, que viveu de 563 a 483 a.C., que depois se cognominou, do sânscrito, 'Buddha' - 'despertado', querendo significar 'esclarecido', 'iluminado') pois elas passam um tanto do desapego e da serenidade que o Budismo prega. Diferente do que se observa em algumas vertentes do cristianismo com relação às imagens, estátuas, relíquias e figuras, em geral aqui estas representações imagéticas não são adoradas, ainda que algumas, pelo seu valor histórico, sejam reverenciadas pelos adeptos de algumas seitas. Budismo é considerado como religião em nossas imprecisas ocidentais considerações, mas muitas vertentes, na verdade, constituem-se  mais como uma espécie de 'filosofia de vida', uma maneira ética de se relacionar com o Cosmos. É assim que eu encaro esta ampla escola de pensamento oriental, mesmo porque creio que só o Zen (e dentro deste, a escola japoneza Sotozen) represente a essência do Budismo, como Lorde Gautama o concebeu. Ele nunca pensou em fundar uma religião e, creio, ficaria 'chocado' com o que algumas correntes eregiram a partir de seus ensinos originais...

Hoje veremos um dos oitos passos do Nobre Caminho Óctuplo, que encerra interessante ensinamento. Esforço Correto (também entendido como Diligência Correta) é aquele passo que abarca um tipo de energia que ajuda ao budista (e qualquer vivente; não tem que ser adepto desta escola de pensamento para auferir sua inteligência...) a percorrer de modo mais apropriado o Caminho do Meio, o Nobre Caminho Óctuplo. Este esforço correto liga-se, creio, ao foco que deve presidir a maioria de nossas ações. Vejamos:

1. Esforçar-se corretamente não significa necessariamente intensidade de praticar, agir. Por exemplo, se nossa prática, nosso agir, qualquer que seja, nos fizer sofrer, ou sofrer a outros, está desvirtuada. Nossa prática e ação deve ser inteligente, baseada na real compreensão do ensinamento subjacente. (No Budismo se diz 'praticar' pois, mediante nosso correto, diligente - aplicado -  agir, nossa atenção constitue-se como que em método para alcançar fins; é metodologia de aprender a viver, de vivenciar)

2. Um Esforço Correto conduz nosso agir a alcançar valores humanos como amor, lealdade, reconciliação. Obviamente quando nos esforçamos de modo correto a alegria e a felicidade a acompanha, mais cedo ou mais tarde - são índices, critérios de nosso esforçar apropriado. Um exemplo: quando se acorda, devemos sorrir - temos a bênção de mais um dia para praticar o Caminho. Mas como sorrir, se acordo com dores, angustiado, temeroso? Sorria para tudo isso também!!  Antigamente eu poderia me assustar quando acordava e ia ao toalete escovar os dentes, com a minha cara amassada. Resolvi colocar no espelho um lembrete tipo post-it que dizia, com aquela figurinha muito conhecida estilizada de sorriso :-) "Sorria!!" e, logo-logo, me condicionei a realizar isto 'automaticamente' nas manhãs, quero dizer, de modo cônscio; sim, consciente da necessidade do sorriso ser presente em meu rosto frente a qualquer situação (minha feição não ajuda muito as pessoas a 'se  soltarem' na minha presença, e se estiver carrancuda, então, pode mesmo assustar...). Mas confesso que ainda tenho dificuldades de manter esta prática; que fazer... - devo insistir, esforçar, pois sei que isso é correto em todos os sentidos!

3. Com o tempo descobre-se que qualquer prática, qualquer agir, se realizado com a energia e disposição da plena atenção, pode ser expressão de um esforço correto. Assim, lavar os pratos, varrer o chão, cuidar de crianças ou idosos adoentados podem ser eventos muito preciosos  (hoje cedo fiquei minhas 3 horas cortando cabelo e barba no asilo, como sempre faço às terças e sextas-feiras, e pude orar ao Pai Celestial mais uma vez pela bênção de poder servi-Lo)  para nosso despertar.

Aprendi em minha vida que o sofrimento é um tipo fundamental de experiência que pode nos conduzir a uma prática, a um agir consciente que, adornado pelo Esforço Correto, nos faz atingir conquistas existenciais, pessoais, muito importantes. Se estamos ansiosos ou tristes, quando assim praticamos sentimos alívio. Necessitamos de muita energia (leia-se estudo, conscientização) para contemplar o sofrimento e investigar suas causas, e sabemos que somente este tipo de compreensão é que poderá nos dizer como (qual o caminho para)  colocar um ponto final no sofrimento. Em outros termos, quando acolhemos o sofrimento, investigando sua(s) origem(ns), poderemos constatar que é possível por um fim no sofrer, visto que existe um caminho para realizar isso. 

O praticar do vivenciar consciente deve ser alegre, prazeroso. Devemos examinar nossa forma de praticar (de agir) em tudo. Não fomos criados para sofrer, ainda que nossa natureza decaída nos induza a isso. Mas, em si, a forma de lidar, de praticar, de agir, com relação a todas as coisas (boas e ruins, doloridas ou agradáveis, ...) deve ser alegre, prazerosa; se não, não estaremos nos esforçando corretamente. 

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

A Ação Correta


A Ação Correta baseia-se na Compreensão Correta, no Pensamento Correto e na Fala Correta, dependo intrinsecamente do Meio de Vida Correto. Implica em praticas que evitam prejudicar os outros, exercendo a não-violência com os demais e consigo mesmo. Para agir corretamente temos que agir sempre com plena atenção, e observamos principalmente quatro áreas de nossa existência muito afetadas neste particular: agir corretamente com relação à Vida, à generosidade, à sexualidade e ao consumo responsável.

Agimos corretamente quando demonstramos reverência pela Vida, não permitindo que se interrompa a vida dos seres viventes; em suma, não matar. No budismo esta ideia associa-se à ideia de Compaixão - o imperativo de amor que surge em nosso íntimo, oriundo do pesar que sentimos ao ver que muitas de nossas ações prejudica aos demais. Significa, então, estar decidido a impedir o sofrimento dos outros, principalmente pela cessação da vida.

Agimos corretamente quando demonstramos generosidade, cultivando a bondade e outras formas de contribuir para o bem-estar dos demais viventes. Posso fazer isso compartilhando meu tempo, energia e recursos, principalmente para os que mais necessitam. Igualmente decido não possuir algo que pertença a outrem, respeitando a propriedade e os direitos alheios; terei uma vida simples, espartana. Decido também, de acordo com este valor, não exercer nenhuma forma de exploração do próximo, contribuindo para a justiça social.

Agimos corretamente quando observamos uma vida sexual que não ofende as pessoas. Nossa tendência ao erotismo é muito forte, e com ela podemos infligir sofrimento ao outro, sejam conhecidos, amigos e principalmente familiares. Devo me comprometer a cultivar a responsabilidade e assimilar meios de proteger a segurança e a integridade de pessoas, casais, famílias, principalmente as crianças. Estas dificuldades geradas pela incontinência e todo tipo de abuso geram sofrimento que perduram toda uma vida, inclusive ao ofensor. Muitas pessoas imaginam que com uma vida sexual superficial aliviam sua solidão ou o sentimento de auto-desvalor, mas sem compreensão, bondade e diálogo (ou seja, amor - e um dos principais é o amor-próprio...) nada disso se consegue.

Agimos corretamente quando comemos, bebemos e consumimos de modo cônscio, responsável os recursos que dispomos. Devo me comprometer a cultivar a boa saúde (física e mental) em mim, minha família e da sociedade. Isto implica também observar o uso apropriado de coisas potencialmente intoxicantes, tanto as materiais (bebidas, alimentos, drogas lícitas e ilícitas, principalmente) quanto as virtuais (certos programas de TV, revistas/livros e filmes, e até conversas ociosas). Temos que nos comprometer a trabalhar duro para alterar a violência, medos, raivas e ressentimentos, confusões (ideias ilógicas) presentes em nosso espirito que nos levam , cônscia ou inconscientemente a utilizar destas ilusões. Ação Correta significa propiciar ao nosso corpo e nossa mente somente nutrientes seguros, sadios, confiáveis. 

Uma vida que privilegia ações corretas pressupõe uma vida de estudo, de 'decodificação' desta extrema complexidade que é o cosmos e nossa existência pessoal e social. Se não tivermos uma clara noção de quem somos e de nossa situação, dificilmente nos engajaremos em ações que possam nos levar ao equilíbrio. 

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Dica de colunista sobre temática importante

Vou passar aqui aos amigos uma dica de colunista do Jornal Folha de São Paulo que aprecio muito - é um conhecido psicanalista italiano radicado na capital do estado. Hoje eu copiei sua coluna semanal, que reproduzo abaixo (depois comento...) :
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"AMOR" LETAL”


Contardo Calligaris, italiano, é psicanalista, doutor em psicologia clínica e escritor. Ensinou Estudos Culturais na New School de NY e foi professor de antropologia médica na Universidade da Califórnia em Berkeley. Reflete sobre cultura, modernidade e as aventuras do espírito contemporâneo (patológicas e ordinárias). Escreve às quintas na versão impressa de "Ilustrada".

<< Obtido em quinta-feira, 31 de janeiro de 2013, site jornal  F. de São Paulo,
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/contardocalligaris/1222907-amor-letal.shtml >>


Algumas reflexões depois de assistir a "Amor", de Michael Haneke. Adolescente, eu já achava bizarra a certeza com a qual alguns amigos se expressavam: "Se eu ficar 'assim'", diziam, "eu me mato na hora. E, por favor, se eu não me matar, seja generoso comigo, mate-me você".


O "assim" que justificava tamanha convicção dependia de relatos, leituras e filmes --ia desde uma impotência sexual talvez passageira (mas que parecia acabar com o charme da vida) até a condição terrificante do protagonista de "Johnny Vai à Guerra", livro e filme de Dalton Trumbo: o soldado Joe, sem braços, sem pernas, sem rosto, parece ser apenas uma carne disforme, enquanto a mente dele continua funcionando.

Eu não concordava com a certeza suicida de meus amigos; imaginava que, antes de decidir me matar, seria bom experimentar minha nova condição durante um tempo. Afinal, em geral, as imperfeições nunca impediram os humanos de viver --ao contrário.

Na época de minha adolescência, não dispúnhamos do exemplo do físico Stephen Hawking ou de Christy Brown, o protagonista de "Meu Pé Esquerdo", de Jim Sheridan. Em compensação, um amigo de meus pais, severamente inválido, disse-me, uma vez: "Você, por exemplo, não pode voar como as aves e é desafinado como um sino quebrado; ou seja, tem coisas que não pode fazer, e você vai procurar o valor de sua vida em outras coisas, que você pode fazer. Comigo não é diferente".

Entendi. Mas me sobrou um certo medo (justamente, pela leitura precoce de "Johnny Vai à Guerra"): poderia acontecer que, de imediato, por causa de um acidente cerebral ou, sei lá, de um incidente de carro, eu me encontrasse numa condição na qual eu não quisesse viver de jeito nenhum e na qual eu não tivesse sequer a capacidade material e mental de pôr fim à minha vida ou de pedir para um próximo que ele me ajudasse a morrer.

Anos atrás, conheci alguém realmente preocupado (muito mais do que eu) com essa eventualidade. Ele envelheceu desesperado, oscilando entre o medo de se matar cedo demais, quando ainda poderia viver um tempo que valesse a pena, e o perigo de esperar além da conta e decidir sair de cena quando ele não tivesse mais condição de se matar ou de pedir a alguém que o matasse.

O mesmo alguém se consolava pensando assim: no caso extremo em que eu não pudesse mais pedir, quem me ama (ou melhor, quem amava aquela pessoa que eu era antes) saberá decidir que eu, embora impedido de me manifestar por minha invalidez, não estou querendo mais viver. Nessa situação, para quem me ama (ou amava, que seja), me ajudar a morrer seria um gesto de amor.

Pois é. Não é tão fácil assim nem tão claro. Na sua coluna de sexta passada, Barbara Gancia escreveu, com razão, que "o fardo de cuidar dos idosos tornou-se um dos maiores dramas da atualidade". Os avanços da medicina fazem que, hoje, sejam cada vez mais numerosos os que cuidam de próximos que sobrevivem transformados pela idade, pela invalidez ou pela demência. E sobrevivem, muitas vezes, tanto irreconhecíveis quanto incapazes de reconhecer os que cuidam deles. Perguntas básicas. 

1) Será que o outro que nós amávamos, se ele pudesse escolher, toparia viver como ele está agora? 
2) Será que o ser do qual cuidamos hoje é o mesmo que nós amávamos antes do acidente, da invalidez ou da demência? Se ele não for o mesmo, será que esse "novo" ser não tem seus próprios critérios do que é uma vida que valha a pena de ser vivida --critérios diferentes dos do nosso amado de antes? 
3) Difícil continuar amando alguém que não nos reconhece mais. Mas será que por isso o deixaríamos morrer --por ele não ser mais aquele ou aquela que amávamos? 
4) Por que sempre chega um dia em que ninguém aguenta mais cuidar? É porque o custo (em todos os sentidos) é excessivo e queremos recuperar nossas vidas? Ou é porque é quase impossível fazer o luto de um amado que já se foi, mas continua de corpo presente? 

Acontece que alguém se suicide depois de ter matado um amado inválido e demente, de quem não consegue mais cuidar. É mais que uma maneira de evitar a culpa: renunciando a viver sem você, confirmo que foi por amor que matei você --ou melhor, que matei o desconhecido que tinha tomado seu lugar.

Pois é, foi mesmo por amor que matei você? Ou por vingança, por você ter me deixado sozinho?

Seja como for, fica confirmado, embora num sentido inabitual, que o amor resiste dificilmente ao tempo.
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Estas reflexões são importantes para discutir, em especial para os profissionais de saúde. Eu imprimi o texto e vou usar em sala de aula com os alunos mais avançados. Pensando bem, com todos os alunos; não vou julgar que se deve pensar isso somente quando se tem um ou dois anos a mais de curso... Acho agora que quanto mais cedo se pensar nisto melhor para se tomar uma posição. Os psicólogos são confrontados (na Clínica principalmente) com desafios enormes, e sei que meus alunos não fazem idéia do que vão encontrar.

Fico pensando na formação do Psicólogo - somente 5 anos de estudos o que nossa Lei determina - e no despreparo com que o jovem sai para o mercado, 'imaturo',  no mais das vezes, para as tarefas que deverão desempenhar. Faço um paralelo com a formação de ministros do Evangelho que existem em faculdades de Teologia e Seminários Teológicos de hoje (com cursos regulares de 4 anos para o bacharelado). Com a complexidade e crescentes dificuldades da pós-modernidade, será que um jovem que se forma com 22,  23 anos está preparado realmente? Nos Estados Unidos, sempre se soube, somente quem faz Doutorado em Psicologia pode exercer a Clinica - por isso que psicólogos lá são respeitados e valorados (coisa que não ocorre no Brasil). Pastores lá também tem uma formação mais abrangente, aprofundada, na maioria dos casos. Agora volto para nosso assunto de hoje, suscitado pela cronica do psicanalista Calligaris.

Para os não-cristãos esta questão da morte (e, por extensão, o matar por piedade) se torna um tanto mais complexa elucidar, tantas as referências do mundo para balizar tomadas de decisão sobre um ato que possa solicitar sua opção. A enormidade de textos éticos e legais disponíveis (em especial na web) que discutem esta temática é notória, em vários domínios do saber. Mas por outro lado, se sou cristão, assumo neste âmbito um referencial muito claro na Palavra: há um mandamento claro que determina a todo o crente saber ser Deus o Senhor da vida e, por decorrência, também da morte. Não caberia ao homem realizar algo do exclusivo domínio do Criador. Claro que existem situações extremas que impelem, pelo cansaço, desamparo ou desespero, a pessoa a agir de maneira também 'extrema'. Mas o modo de se iniciar o considerar toda esta complexidade é claro como o dia para o cristão.

Não afirmo, ainda assim, que um Pastor iniciante no Ministério estaria necessariamente, em princípio (veja bem, eu disse  'em princípio', e não  'a princípio'...), melhor preparado do que um Psicólogo para lidar com estas específicas questões, pois nossos problemas podem ser mais (ou menos) 'espirituais', mas as dificuldades de argumentação e consistência de abordagem por parte do especialista - quem quer que seja - exigem preparo em questões 'terrenas' também, e questões estas abarcadas por pessoas que não estão fortes na Palavra e/ou que não são cristãs - algo muito encontradiço hoje, dada a fuga de Deus que se observa na atualidade.

Moral da estória (?): não existe problema 'simples', para o qual soluções 'apresadas',  reducionistas, simplistas, efetivamente deem conta; temos que nos preparar, ministros, profissionais da saúde, legisladores, juristas etc., para confrontar eficazmente desafios enormes, a cada vez mais interrelacionados e abrangentes, de modo a não comprometer, ao final e ao cabo, nossa própria espiritualidade e/ou sanidade...  

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Naturais momentos tristes...

Foto obtida agora via Google Images de
http://quentinmccall.com/ten-steps-to-healing-from-bitterness-and-resentment/
(muito legal este blog, de um palestrante cristão muito conhecido)

Hoje relembrei importante lição sobre uma majoritária vivência humana, importante para o 'sentir-se vivo'... Quando as coisas saem erradas, ocorrem de modo que não esperávamos, ou quando as más notícias nos surpreendem, ficamos  tristes, por vezes aterrados. Para o cristão esta experiência pode se traduzir em profundo aprendizado de relacionamento que devemos ter com o Pai Celestial.

A primeira noção que devemos apreciar neste âmbito é que é normal, natural sentir-se deprimido, entristecido com estas situações - o nosso corpo parece responder de modo autônomo. Muitas pessoas odeiam entrar neste estado, mas ele é tão natural quanto a alegria ou a saudade. Sim, pode ocorrer que ela venha 'do nada', sem razão ou motivo - e temos de igual modo que investigar seu porquê. Pode ser necessário a ajuda de um terapeuta para debelar o incômodo físico, mas o maior problema situa-se na mente, ou na alma, se você preferir. Veja a camiseta acima: ela diz que a amargura, a mágoa é (um tipo) de veneno que tomamos e que se espera (por vezes) que outra pessoa vá morrer... É horrível passar por isso, e precisamos dar conta da provação. O problema é como lidamos com o sentimento.

Vi no devocionário hoje cedo que o cristão deve meditar um aspecto desta vivência de tristeza, de amargura natural que todos passamos: onde estamos a derramar nossas lágrimas? Se a jogamos no chão, nos ombros de pessoas (que acreditamos vá nos fazer suplantar a dor), no lenço ou no travesseiro pode ser que elas vão secar sem que as coisas mudem para mudar também nosso sentimento. Quantas vezes não queremos que primeiro  se mude o cenário, os fatos, as pessoas ou as notícias para daí sim a gente tornar o sentimento? É uma espécie de 'mágica' o que queremos.

 Agora, o cristão que faz jus ao nome deve saber que nossas lágrimas devem ser derramadas aos pés do Senhor, e crer que Ele nos dará a paz que necessitamos. Não, isto nunca se assemelha ao processo 'mágico' aludido acima, pois ser cristão não implica inação; aprendi certa vez com um importante líder que, 'imediatamente' após a oração, devemos fazer de tudo para que a bênção rogada se realize...  Ou seja, nunca se deve abster de fazer o que temos (nós e, por vezes, somente nós) que fazer. Isto implica sempre estudar a Palavra para saber o que necessitamos saber (para todos os momentos, inclusive para os tristes).

Nossa fé em Cristo determina que, pela confiança nEle, teremos o auxílio, o amparo que necessitamos em qualquer situação, mesmo as inesperadas, as temidas, as entristecedoras.  Isto é um ensino espiritual - não espere que o mundo materialista e determinista vá entender o processo e as implicações conexas. No limite, trata-se de uma experiência pessoal, pertencente ao Convênio (Pacto), à Aliança que todo cristão adentra ao aceitar Jesus como seu Salvador. O mundo exige fatos, demostração inequívoca (ou estatística) do relacionamento causa-e-efeito entre os fenômenos, mas no campo que estamos aqui refletindo, o requisito primeiro é a fé. Isto estabelece um patamar diferenciado de julgamento, de consideração das coisas, dos sentimentos e pensamentos. O cristão acredita e tem certeza que o Senhor vai ajudá-lo (soberanamente) a superar a situação, a Seu tempo e modo.

Estas vivências não se demonstram - somente podemos dar nosso depoimento. Cada um deve passar por ela e julgar. Quando se procura a Deus em primeiro lugar (e não uma pessoa e/ou suas idéias...) demonstramos que confiamos nEle. Quando procuramos alguém, pode ser que esta pessoa não nos ouça como necessitamos, mas podemos ter certeza que Ele nos ouvirá. Não podemos passar pelas experiências espirituais com os olhos do mundo - nunca nos satisfaremos com as 'justificativas', com as suposições especulativas, com as expectivas causais, deterministas que o senso terreal  solicita ou fornece. 

No domínio do mundo, temos que 'ver para crer'; ou seja, demonstrado os fatos e sua ligação, aí (então) cremos. No reino espiritual, temos que ter em mente que a questão é pessoal (entre Deus e nós, sua especial criação), e que a equação se inverte. O que ocorre é que a todos é feito o convite: "vem, e vê" (João 1: 46; 11: 34; Lucas 6: 47; Apocalipse 6: 3 e 7; 22: 17)... ou seja, experiencie, vivencie o relacionamento com Deus, experimente a graça (sobre graça) imerecida, e saiba do fundo do coração que, se tiver a fé, aí então 'verá', conhecerá, saberá.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

O Mosquito e o Touro: presunção...

Foto obtida agora via Google Images de
http://blog.opovo.com.br

Vamos dar agora uma pausa nos posts sobre o Nobre Caminho Óctuplo, para um pequeno comentário, tendo uma fábula de Esopo como pano de fundo. Esta fábula é muito conhecida (se você colocar a primeira parte do título deste post no Google Images, verá o endereço de vários blogs que comentam sobre a fábula...) e relata um mosquito que, após ficar zumbindo por vários minutos em volta da cabeça de um touro, finalmente pousou na ponta de um dos chifres e respeitosamente perdiu perdão ao boi por perturba-lo: "Se meu peso está lhe causando algum inconveniente, basta você me dizer que eu me retiro num momento!"  Respondeu-lhe o touro "Oh, não se preocupe com isso; para mim tanto faz se você ficar ou permanecer... Para lhe dizer a verdade, eu nem mesmo  tinha reparado que você estava aí..."  No libreto que sempre consulto (Zipes, Jack. Aesop's Fables. London: Penguin Books, 1996, p. 104; Penguin Popular Classics n. 20), a moral da estória adverte-nos que quanto mais pequeno é o espírito, maior a presunção.

No dicionário Houaiss, 'presunção' remete tanto à idéia de uma opinião demasiado boa e lisonjeira sobre si mesmo, quanto às idéias de imodéstia, vaidade; remete à confiança excessiva em si mesmo, à pretensão. Remete também, segundo vejo, à vaidade, orgulho e soberba, mesmo até certa arrogância. Desde que o mundo é mundo esta tendência é muito encontradiça nas gentes, em especial as que necessitaram realizar um esforço de superação de dificuldades (notadamente as interpessoais) na infância. Não escolhe idade, sexo ou condição, mas parece acometer mais àqueles ou àquelas que se encontram em posição de poder, qualquer que seja ele - principalmente nos políticos...

Eu vejo nisso a evidência da falta de sabedoria; no limite, falta de Deus no coração. A mínima reflexão que o vivente possa realizar remeteria ao questionamento desta infeliz postura, e isso não só resultante dos embates e 'cabeçadas' que a vida nos endereça neste mistér, mas também, e complementarmente, do simples e sincero meditar sobre as dificuldades e descalabros dos nossos semelhantes neste âmbito. 

Vigio-me sempre para averiguar se não caio nesta tentação, pois conto comigo somente: as pessoas, no polo positivo, temem ser tachadas de grosseiras ou enxeridas, e evitam assim ser sinceras. E deste modo podemos ter ou demonstrar a pecha aqui discutida, mesmo sem o desejarmos... Que falta me faz um amigo de verdade! Mas parece que é um 'artigo' muito raro nos dias de hoje, e me pergunto sempre o porquê - será a TV? As novas mídias sociais? A superficialidade dos relacionamentos, o efêmero dos contatos interpessoais? A complexidade - e também a velocidade - às quais a tékhnè nos impele? O fato é que nem nas Igrejas, nas Comunidades religiosas, onde deveria imperar outro tipo de valor, de viver, se encontra facilmente amizade como Cristo demandou, modelo perfeito que foi para a Humanidade. 

Que riqueza se você tiver um amigo ou amiga que te goste do jeito que você é, e que não tema ser honesto(a) sempre contigo: vale mais que muitos rubis... Mas como disse, amizade de verdade é coisa escassa hoje em dia, infelizmente. Colegas ou 'conhecidos' temos diversos mas, amigos, talvez os contemos numa vida somente nos dedos de uma só mão!

sábado, 26 de janeiro de 2013

A Fala Correta


Interessante ficar estabelecido, desde os primórdios dos ensinamentos proferidos pelo Lorde Sidharta a necessidade de cultivar a Fala Correta. Quantos sábios não apontaram para as inúmeras ruínas pessoais, sociais, comunitárias, nacionais etc. determinadas pelo uso impróprio da linguagem. A língua é uma espada de dois gumes! Tanto constrói como destrói.

Todos sabemos que para falar corretamente temos que pensar corretamente; em outros termos, a Fala Correta baseia-se no Pensamento Correto (q. v.), pois o falar consiste no nosso pensamento, expresso sob a forma de encadeamentos adequados de sons, que se articulam em conceitos, estas em ideias, e estas originam os raciocínios. O fantástico é que quando falamos, nossos pensamentos adentram a esfera do público – não mais nos pertencem, deixam de ser particulares, e isso falando pessoalmente, via computador ou pelo telefone...

Estes tempos tem a marca dos sistemas e técnicas de comunicação cada vez mais sofisticados e abrangentes; o que ocorre num lugar pode ser imediatamente conhecido no outro lado do mundo! As ferramentas disponíveis parecem conectar as pessoas instantaneamente, pessoal ou remotamente, analógica ou digitalmente. O contraditório é que a comunicação interpessoal parece, a cada momento, mais difícil de realizar-se de modo excelente, profícuo, pois há muita incompreensão, bloqueios, mal-entendidos e aborrecimentos a partir do que o outro nos diz aqui e acolá. 

A condição fundamental da Fala Correta é o ouvir com atenção. Pode parecer banal, mas o que menos se vê é alguém ‘escutando’; os diálogos por vezes parecem solilóquios, discursos para plateia que não quer ouvir, monólogos frente ao espelho. O que sabemos é que, assim,  se não se consegue escutar de modo cônscio, não se pode realizar a  Fala Correta, pois fica-se girando em torno de nossas ideias, não respondendo ao que o outro ou outra efetivamente disse. Eu vislumbro isso toda vez que tenho a impressão, a partir do que o outro profere, de que este outro não está a me escutar; é como se ele ou ela parecesse não assumir ou considerar o que eu estou pensando, dizendo em nossa conversa, nas suas falas... é muito estranho. Tem conversa que saímos dela ‘iguais’ como no começo da mesma!

Muitas vezes consultamos um terapeuta porque não conseguimos conversar com o próximo e, pior, conosco mesmo... A pessoa que tem problemas comunicacionais habitualmente tem dificuldades na família, no emprego, na escola etc. Um dos conselhos que os psicoterapeutas encorajam é a pessoa escrever o que precisa falar – cartas ou mesmo e-mails. Escrever dá mais segurança pois pode-se refletir melhor o que vai se dizer; visualizamos o que o outro pode pensar, ao lermos nossas palavras e, assim, ‘calibrar’ nossos termos e avaliar sempre a adequação do que queremos transmitir. Mas escrever é difícil, tememos a avaliação do outro.

Um outro conselho, agora prescrito por mestres zen, é praticar o silêncio; em outras palavras, ficar menos dependente e escravizado pelas palavras. Quando se pratica o silêncio, meditando sentado, andando ou agindo (p. ex., lavrar pratos é uma excelente contemplação, dizem os adeptos avançados da meditação, o que eu concordo em gênero, número e grau) abrimos boas portas para exercitar a clareza dos nossos próprios pontos de vista e averiguar os bloqueios que subjazem em nossa forma de pensar. Se aprendermos a ouvir com a mente em silêncio, veremos que podemos compreender muito mais a partir das mesmas coisas que estão à nossa frente.

A fala, como qualquer ferramenta, é perigosa se usada de modo impróprio. A pessoa sábia é aquela que se conscientiza que a fala deve ser construtiva, amorosa, compassiva. 

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Relatividades... e outros comentários

Foto obtida agora via Google Images, de
http://rodrigobennett.blogspot.com.br/2011/04/2-ano-unificado-revisao.html


Que tempos, os atuais... Não, não vou ficar rememorando o passado, como é costume da humanidade, desde que o mundo é mundo... Sempre os tempos passados serão ‘melhores’ que os atuais, pois esta (vaga) impressão prende-se mais às emoções da imaturidade do que a uma análise realista, concreta, que compare situações parcamente assemelhadas de modo isento. Talvez o mais correto seja dizer – que situações estas...

Pois é. Gosto de ficar lendo jornais (acho que já disse que isto vem da minha infância, pois meu pai sempre assinou os 2 principais jornais do estado de São Paulo), coisa que chego a gastar quase 2 horas. Leitura e reflexão de jornal impresso e digital: atualmente é a Folha de São Paulo (que ocasionalmente troco pelo Estadão com o amigo Nathanael) e o Diário Popular (de Campinas, SP).  Vejo principalmente a economia e o ambiente de negócios, as tendências, os principais colunistas (de várias áreas), as esquisitices da conduta humana e a parte da Literatura. Tudo isso me é importante para manter atualizado para as docências diversas que sou responsável. Ah, e sempre recorto algo para usar em sala de aula, acho que é motivador para o aluno refletir coisa bem atual...

Vi ontem que a nossa Presidenta da República mandou baixar ‘por decreto’ o preço da energia elétrica. Qualquer mané hoje sabe que isto não se faz, mas no Brasil o populismo, jogar para o eleitorado, ainda é prática primordial dos nossos dignos representantes democráticos, praticantes em sua maioria da mais abjeta política. E ela parece afirmar, com toda a candura, que tal medida ‘não vai onerar o Tesouro’... Fico pensando se Planejamento, Projeto e Estratégia não são disciplinas prioritárias no serviço público, pois na iniciativa privada certamente o são. Por outro lado também me consolo, ao ler os jornais, pois eu poderia ter nascido em outro país, e é só olhar para alguns vizinhos nossos aqui do continente para ver que lá também os políticos fazem cada coisa! Acho que é atavismo inerente à classe...

Ante-ontem li crônica interessante de Marcelo Coelho na Folha (Tempo de Kindle, caderno ‘Ilustrada’, quarta-feira, 23 de janeiro de 2013, Ano 92, nro. 30.611, p. E-8). Ele falou de algo caro para mim, que sou de tempos antigos: as características ‘fisicalistas’, concretas, materiais dos livros impressos, como p. ex. o cheiro do livro. Ele derruba muitos mitos criados por esta ideia do livro de papel, mas acho que ele nunca teve uma Enciclopaedia Britannica, senão diria que gosta do cheiro, sim... Mas, falando sério, ele fala coisas precisas (quem nunca cortou dedo com folha de papel – arde à beça...) na comparação com esta fase atual de supervalorização do livro eletrônico, do e-book, do arquivo digital. Boa colaboração nesta fase de transição.

Mas o que eu queria ilustrar com este exemplo é a mania pós-moderna de desconstruir tudo. Hoje nada mais parece ser bem estabelecido – sempre tem alguém para nos alertar (às vezes fica somente na pretensão...) de nosso erro ou engano, ilusão, como a precificação das commodities, o valor do livro, a religião ou religiosidade etc. Sempre tem um quase-mané para palpitar, e pior, quando demonstra não ‘ter feito a lição de casa’ para proferir suas opiniões (tem alguns que falam cada bobagem!! E o mais gozado é que não parecem ligar para o ‘mico’ que estão a pagar... ). Acho que existem colunistas hoje nos jornais matutando o dia todo sobre qual sandice irão proferir para manter suas colunas polêmicas. Eles acham cada coisa para comentar, algumas úteis outras perda total de tempo! Mas não existem mais, ao que parece, valores eternos, fixos, imutáveis (a não ser para o cristão, pois Deus, cremos, não muda: ele é fiel, e Sua Palavra subsiste para sempre); tudo é relativo, provisório, questionável.  Fico a pensar nos jovens de hoje, que ficam como que 'perdidos' mesmo, com tanta gente falando contra e a favor de algo, ao mesmo tempo. Quem ainda não tem senso crítico formado padece sem dó, ao que parece!

Ontem vieram aqui nos visitar o bebê Ariel e seus pais, o sobrinho da Ruth, Sandro, e a esposa Jéssica. O casal foi ao banco perto aqui no centro e deixou comigo o petiz, que não sentiu falta dos genitores. Ele é muito inteligente e bem amadurecido para a idade; gosta de explorar o ambiente e de aprender, mediante diversas brincadeiras, e eu gostei de averiguar quantas estruturas psiconeurológicas e psicomotoras o nenê já possui. Depois que Ruth chegou da rua e começou a fazer o almoço, fiz o guri dormir – logo pegou no sono, cansado de andar com os pais e de me suportar, e 'desmaiou' por uma hora. Ainda estou bem treinado na lida com a nenezada, veja só; fiquei emocionado ao lembrar do quanto eu cuidava e embalava meus quatro filhos. Aproveitei bem enquanto eles foram crianças, com a graça de Deus. Isto, as boas lembranças e o amor que se dedica às crianças, as ex-esposas, que amam ver o pai sofrer a saudade e a ausência longe dos rebentos (que modo lamentável se pensar valorizadas, inclusive fazendo assim sofrer também os filhos e filhas), nunca podem tirar dos pais...

Meus pais estão, em Campinas, digitalizando centenas de slides antigos, fotos tiradas na nossa infância. Vou pegar todo este acervo e mandar para meus filhos, pois meus netos e bisnetos terão curiosidade de ver como eram meus pais e avós, com toda a certeza... É muito importante cultivar os laços com as pessoas de onde viemos. E nunca vi ou soube muitos detalhes de meus bisavós ou seus pais e avós, e eu adoraria conhecer de onde vim. Imagine se eu encontrasse um antepassado de quem eu sou hoje uma espécie de ‘reedição’? Pois é bem possível: meu filho José Geraldo ficou pasmo ao saber que seu primogênito, o Drake, era muito parecido comigo, e que era parecido com ele também quando nasceu, um nenê que parecia um japonezinho, com olhos bem puxados, branquinho e risonho...

Hoje é data comemorativa da cidade que nasci - São Paulo. Tenho satisfação em dizer que sou Paulista, Paulistano e São-Paulino, e ainda por cima nasci no Hospital São Paulo. Poderia me chamar Paulo, que nome de peso - admiro muito o evangelista. Tenho até um Dicionário sobre os seus escritos, muito bom!

Agora vou ao centro - fechar conta em banco, averiguar o jornal do dia (não assino porque normalmente leio na Universidade, e o entregador aqui é muito irregular...), encontrar algumas pessoas para trocar idéias. Amanhã dou continuidade com a série sobre o Caminho Óctuplo, prometo!

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

O Caminho Óctuplo: a Atenção Correta.


Continuando com nossas singelas prédicas sobre a existência plena na psicologia budista, veremos hoje, depois de viagens de férias, o terceiro aspecto compreendido no Nobre Caminho das Oito Vias, ou Caminho Óctuplo.

A Atenção (Plena) Correta sempre esteve no âmago do ensino do príncipe Sidharta, abrangendo a energia que nos traz, a cada momento, precisamente de volta para o momento presente, o que vulgarmente se nomeia o ‘aqui-e-agora’. É um dos mais preciosos ensinamentos, e existem livros e livros dedicados à sua compreensão. Tentarei aqui resumir um pouco do ensinamento oriental, sabendo que algo se perde neste esforço de concisão. Conto com sua paciência!

Na psicologia budista, a atenção tem a característica de ser universal; em outros termos, sempre se está dando atenção a algo, mesmo quando se está devaneando, aparentemente alheio aos fatos. Nossa atenção pode ser apropriada, quando estamos inteiramente imersos no momento presente, ou pode ser inapropriada, quando nos atemos a algo que nos afasta do aqui-e-agora. Assim, a atenção plena consiste em lembrar-se de voltar constante e conscientemente ao momento presente, que é onde nós efetivamente existimos.

Um dos caminhos ensinados no Zen Budismo para treinar a atenção plena (conheço muitos outros...) consiste em praticar os ‘Sete Milagres da Atenção Plena’.  O primeiro deles é atentar para a miríade de fenômenos e coisas que nos cercam, a profusão de eventos e oportunidades com que somos agraciados a cada momento. Creio que o principal desta constatação de inúmeras ‘coisas’ que nos cercam é que Pessoas, não meras outras pessoas, outras indiferentes e anônimas gentes, se nos relacionam, a cada momento. Cada pessoa com sua história e valores únicos. Estar atento de modo pleno com estas pessoas pressupõe ser capaz de entrar em contato profundo com estas pessoas e os diversos elementos de sua pessoalidade (algo que, se não cultivarmos a Atenção Plena, se perde, ou seja, dela, sua pessoalidade singular, não nos tornamos cônscios).

O segundo milagre da Atenção Plena consiste que as coisas e principalmente as pessoas também se façam, com nossa Atenção Plena, efetivamente presentes para o pleno (enriquecedor) encontro. Na psicologia búdica, se algum de dois indivíduos não se faz ‘presente’, é como que a realidade do encontro se tornasse como que uma ilusão, um sonho, pois o corpo pode estar presente, mas a mente não;  então, rompida a dualidade (que se pretende indissociável) mente-corpo, a pessoa tem uma parte de si num lugar, e outra parte noutro lugar; somente uma delas está ‘presente’...

O terceiro milagre da Atenção Plena consiste em alentar, nutrir o objeto de nossa atenção, não ser indiferente ou neutro em relação a ele, implicando nos devotar todo o nosso ser na relação, no envolver com o outro. Implica também evitar pressuposições, assumir ‘verdades’ sobre o outro ou coisa, sem base, o que atrapalha descobrir fatos novos e auferir a verdade em si a partir da relação.

O quarto milagre da Atenção Plena é, coerente com o que prega a doutrina búdica, aliviar o sofrimento de outra pessoa, que se materializa inclusive nos pequenos gestos, como, p. ex.,  o modo com que olhamos para o outro. Assim, amar pode significar também nutrir o outro com nossa atenção, com nossa presença ativa. Já se disse que a melhor coisa que podemos fazer na situação de alguém que está a entregar sua alma é estar a seu lado, ‘apoiando’. Não se pode às vezes fazer mais nada para evitar a morte da pessoa, mas ela morrerá muito melhor se estivermos ao seu lado atentamente, do que se ela falecesse sozinha.

A contemplação profunda, um dos aspectos da meditação, é o quinto milagre da Atenção Plena, consistindo no fato de que, relaxados e concentrados, poderemos nos habilitar a olhar para os objetos e fenômenos com profundidade: estar-se-á cônscio do conteúdo de nossa Consciência sobre aquilo que se está a contemplar.

O sexto milagre da Atenção Plena é a compreensão resultante, como quando entendemos algo dizemos “ah, agora ‘vejo’ “. Ou seja, começa-se a ‘enxergar’ algo que antes não se vislumbrava; algo que surge à nossa frente ou em nossa mente, quando a constatamos dizemos que este algo apareceu, surgiu ‘dentro’ de nós. Ver, enxergar, surgir, compreender, tudo isto ocorre aqui neste momento, aqui-e-agora.

Finalmente, o  sétimo milagre da Atenção Plena é a mudança ou, uma palavra melhor, transformação, que ocorre como resultado da prática séria, consciente. Mas transformação de quê? Do sofrimento, de nossa dor, do apego. Atualmente vemos uma exacerbação do apego das pessoas com as coisas ilusórias da sociedade consumista, redundando muitas vezes em vícios, sendo o mais trágico os relacionados às drogas, lícitas ou ilícitas. Chega-se ao ponto de as autoridades terem que internar, contra a vontade das pessoas, os adictos em clínicas, pois elas não tem mais como visualizar seus desejos decaídos, destruidores, e os efeitos decorrentes de suas atitudes. Mas nunca vão se reerguer, curar-se, se não estiverem cônscias, se não virem claramente (ou seja, com Plena Atenção) o que elas fazem consigo...