Interessante ficar estabelecido,
desde os primórdios dos ensinamentos proferidos pelo Lorde Sidharta a
necessidade de cultivar a Fala Correta. Quantos sábios não apontaram para as
inúmeras ruínas pessoais, sociais, comunitárias, nacionais etc. determinadas
pelo uso impróprio da linguagem. A língua é uma espada de dois gumes! Tanto constrói como destrói.
Todos sabemos que para falar
corretamente temos que pensar corretamente; em outros termos, a Fala Correta
baseia-se no Pensamento Correto (q. v.), pois o falar consiste no nosso pensamento,
expresso sob a forma de encadeamentos adequados de sons, que se articulam em
conceitos, estas em ideias, e estas originam os raciocínios. O fantástico é que
quando falamos, nossos pensamentos adentram a esfera do público – não mais nos
pertencem, deixam de ser particulares, e isso falando pessoalmente, via
computador ou pelo telefone...
Estes tempos tem a marca dos
sistemas e técnicas de comunicação cada vez mais sofisticados e abrangentes; o
que ocorre num lugar pode ser imediatamente conhecido no outro lado do mundo!
As ferramentas disponíveis parecem conectar as pessoas instantaneamente,
pessoal ou remotamente, analógica ou digitalmente. O contraditório é que a
comunicação interpessoal parece, a cada momento, mais difícil de realizar-se de
modo excelente, profícuo, pois há muita incompreensão, bloqueios,
mal-entendidos e aborrecimentos a partir do que o outro nos diz aqui e
acolá.
A condição fundamental da Fala
Correta é o ouvir com atenção. Pode parecer banal, mas o que menos se vê é
alguém ‘escutando’; os diálogos por vezes parecem solilóquios, discursos para
plateia que não quer ouvir, monólogos frente ao espelho. O que sabemos é que, assim, se
não se consegue escutar de modo cônscio, não se pode realizar a Fala Correta, pois fica-se girando em torno
de nossas ideias, não respondendo ao que o outro ou outra efetivamente disse.
Eu vislumbro isso toda vez que tenho a impressão, a partir do que o outro
profere, de que este outro não está a me escutar; é como se ele ou ela
parecesse não assumir ou considerar o que eu estou pensando, dizendo em nossa conversa,
nas suas falas... é muito estranho. Tem conversa que saímos dela
‘iguais’ como no começo da mesma!
Muitas vezes consultamos um
terapeuta porque não conseguimos conversar com o próximo e, pior, conosco
mesmo... A pessoa que tem problemas comunicacionais habitualmente tem
dificuldades na família, no emprego, na escola etc. Um dos conselhos que os
psicoterapeutas encorajam é a pessoa escrever o que precisa falar – cartas ou
mesmo e-mails. Escrever dá mais segurança pois pode-se refletir melhor o que
vai se dizer; visualizamos o que o outro pode pensar, ao lermos nossas palavras
e, assim, ‘calibrar’ nossos termos e avaliar sempre a adequação do que queremos
transmitir. Mas escrever é difícil, tememos a avaliação do outro.
Um outro conselho, agora
prescrito por mestres zen, é praticar o silêncio; em outras palavras, ficar
menos dependente e escravizado pelas palavras. Quando se pratica o silêncio,
meditando sentado, andando ou agindo (p. ex., lavrar pratos é uma excelente contemplação, dizem os adeptos avançados da meditação, o que eu concordo em
gênero, número e grau) abrimos boas portas para exercitar a clareza dos nossos
próprios pontos de vista e averiguar os bloqueios que subjazem em nossa forma
de pensar. Se aprendermos a ouvir com a mente em silêncio, veremos que podemos
compreender muito mais a partir das mesmas coisas que estão à nossa frente.
A fala, como qualquer ferramenta,
é perigosa se usada de modo impróprio. A pessoa sábia é aquela que se
conscientiza que a fala deve ser construtiva, amorosa, compassiva.