Ontem ocorreu novamente comigo algo que me fez decidir – ‘escreverei sobre isso no
blog’... Este tipo de acontecimento sempre me acompanhou, e acho que vai morrer
comigo. Vou contar primeiro o que sucedeu, e depois vou ‘filosofar’ a respeito.
Período
natalino, com lojas abertas até altas horas (muitos funcionários gostariam de
estar em casa ou com amigos, mas estão a trabalhar – dinheiro extra, mas mais
cansaço... os onipresentes conflitos modernos!). Estava a passear no centro desta querida São João com Bilú, em visita a vitrines e eventuais comprinhas, com a minha
habitual boa vontade (diferente do normal dos maridos...), quando Bilú encontra
uma simpática colega da Universidade que trabalha freelance em uma loja. Ficaram as duas
a confabular e eu, recostado na parede, esperando o desenlace da conversa,
mirando o movimento das pessoas e ocasionalmente as duas e sua (suas?) parlenda.
Em dado momento a colega de Bilú me diz, em quase tom de brincadeira (com fundo
de verdade): “não fica bravo comigo,
olhando com esta cara feia, que eu libero logo sua mulher...” Mas eu não estava bravo ou olhando com cara
feia, juro! Homessa, pensei, o que levou a raparigota a proferir aquela desconexa
percepção? Mas tenho suspeitas...
Devo
confessar que esta situação me deixava, tempos atrás, muito contrariado. Com
algumas pessoas cheguei a increpar o dislate, denunciando pedagógica e
psicologicamente a falta de lógica da percepção da pessoa etc... O que ocorreu
é que, ali, eu não estava (sei que talvez só para mim, adianto) efetivamente bravo
ou aborrecido; a colega da Ruth, a seu bel-prazer, ‘concluía’ esta minha disposição,
e a assumia verdadeira, sabe-se lá a que título, baseada em nebulosa evidência.
Viu
a foto? Você consegue inferir com certeza meu estado de espírito? Sei que a primeira
impressão pode ser negativa. Juro que quando aqui fui clicado estava super bem e
queria sair ‘bem na foto’... Sei que minha feição ali, que é a minha habitual pode,
a princípio, ensejar a pessoa a
imaginar isso de negatividade. Na verdade, a minha intenção é fazer, apresentar no dia a dia sempre esta
feição:
Sei,
como bom psicólogo, que a primeira impressão pode determinar toda a evolução de
um relacionamento, pois as primeiras expectativas criadas sempre pautam nossas
posteriores ações. Sempre que entro numa classe onde iniciarei uma disciplina,
procuro ser MUITO risonho e amigável pois, pelo lado dos alunos, a ansiedade e
excitação predispõem ainda mais as almas alarmadas a deturpar, enviesar suas percepções. Mas imagine para mim, que não tenho o costume
de ser risonho, ter que ficar o tempo todo com um sorriso estampado, imaginando
com isso que as pessoas não vão me afastar pelo feiume da minha carranca? Será
que as pessoas não sabem, inversamente, que existem inúmeras pessoas risonhas,
amigáveis na aparência exterior, que são falsas e fementidas? Gostaria de ser
exteriormente como alguns conhecidos, que parecem sempre ter acabado de ouvir
uma boa notícia (a muitos, não interiormente, pois são falsos e desleais,
apesar da casca)... Mas não sou assim, que fazer... e será que por isso 'sou' sempre perigoso, ameaçador? Sei que divisar alguém com rosto (aparente) inamistoso, e
com 1,90 m.
como eu aconselha a qualquer um a se manter cauteloso, arredio; mas serei
perigoso assim necessariamente com tão poucos, subjetivos e ilusórios indícios???
Será que os jornais (ou a TV), com a onipresente violência, nos faz hoje tão
medrosos?
Mas
acontece isto volta e meia comigo – as pessoas pensam que estou aborrecido ou
bravo. Não perguntam se há algo comigo (posso até estar com cara de poucos amigos por causa de algum desconforto ou tristeza, ou...) – pensam que é 'ameaçador contra elas', em tese;
parecem sentir-se ameaçadas, e reagem antecipadamente como se eu fosse
agredi-las, vai saber por quê... Nem adianta, muitas vezes, tentar dealbar o
mal-entendido, a falha apercepção da pessoa a meu respeito – as pessoas pensam
que faço troça. E sei que, quanto mais
inseguras, mais as pessoas tendem a achar que estou bravo ou aborrecido ou que
posso espanca-las a qualquer momento, etc...
Uma coisa muito aborrecida e tediosa. Que indigência mental.
Talvez,
se eu gostasse de beber, ficaria sempre alegre, como vejo ser a estratégia de
algumas pessoas que assim ficam eufóricas, amistosas. Conheci uma pessoa carismática que andava com uma latinha de cerveja na mão o dia inteiro; seu trabalho permitia isso, e seus clientes também apreciavam a bebida naquele ambiente - inclusive era certa estratégia de marketing, eficiente, por sinal - era uma borracharia. Mas tenho horror a isso,
acho patética esta situação toda de ajuntamento em torno de bebida; as pessoas falam muitas bobagens ao sabor do
efeito etílico, e eu gosto de ficar calado a falar sem necessidade ou verbalizar banalidades. Na verdade, poucas pessoas hoje em dia se dispõem a engajar em uma
conversa construtiva; parece que pensar dá dor de cabeça, pois vejo muita
preguiça ‘mental’, enfado, superficialidades, sei lá.
Na
época da faculdade, nos anos 70, aprendi com o renomado psicólogo americano Carl
Rogers (no famoso livro ‘Tornar-se Pessoa’; em inglês, On Becoming a Person) que não adianta ser uma pessoa que não somos,
fabricar algo para servir ao outro, interesseiramente. Ao longo do tempo estas
falsas relações são danosas, a todos e todas. Resolvi ser o que sou, sempre (eu tinha na Faculdade de Psicologia uma amiga mais velha, Ignez Toledo - saudades - que me ensinou muito). Isto
implica em ser honesto e dizer coisas que as pessoas não gostam de ouvir, mesmo
que você não grite nem ofenda ao outro – mas enfim você acaba dizendo o que
elas não gostariam de escutar. Ocorre que, nesta época atual de relações superficiais,
robotizadas pela web, 'tipo' o que se vê nas redes sociais como o facebook (que
evito a todo custo), isto – a honestidade relacional - não é eficiente, pois as
expectativas das pessoas estão mais lábeis, instáveis e pior, tendenciosas ao
extremo, privilegiando o ego em detrimento daquilo que respeita ao comum, ao
coletivo, às amizades ou parcerias, que pressupõem para seu sucesso certa carga de maturidade.
Sei
que, com algumas pessoas, nem se Jesus Cristo viesse e dissesse que ela está
errada nisto ou naquilo, a mesma não acreditaria e encrencaria com Ele. Aprendi
a identificar pessoas assim e não perco mais tempo com tais criaturas; é malhar
em ferro frio, o que acaba se voltando contra nós. Sei também que se eu fosse rico financeiramente (pois me considero muito rico em casamento, em familia, em saúde, em religião, em paz de espírito) teria muitos 'amigos' mais; teria muito mais pessoas que não se assustariam com meu rosto inamistoso; teria muito mais pessoas com boa vontade para me conhecer de verdade.
Creio
que esta minha incapacidade de ‘sorrir’ me prejudica; mas, por outro lado, creio
que ganho se não me relaciono com pessoas que se deixam impressionar por causa
de ‘cara feia’. Isto tudo me faz solitário, que fazer. Toda manhã ao estudar a
Palavra encontro consolo, e procuro fazer o meu melhor. Ainda estou aprendendo,
e tento aos trancos e barrancos compreender ao outro. Mas confesso que tenho
voltado a me relacionar mais com pessoas
de idade, como no meu tempo de criança e adolescente, por bênção de trabalhar
em 2 asilos. Lá tem muita pessoa autêntica, que gosta de verdade de você, com
seus defeitos e incapacidades, e que não te teme gratuitamente somente por
causa da sua cara feia....